quinta-feira, 9 de abril de 2009

CUIDADOS AO PRODUZIR GRÁFICOS - PARTE 6 - GRÁFICOS SOBRE DINHEIRO SÓ FAZEM SENTIDO SE OS VALORES TÊM A MESMA REFERÊNCIA

O valor do dinheiro muda com o tempo, devido à inflação. Como a inflação é quase sempre positiva, o dinheiro tende a desvalorizar com o tempo. Não faz sentido comparar o valor nominal atual e de vinte anos atrás do preço de um quilo de laranja ou de um quilo de carne. No entanto, faz sentido comparar o preço entre as laranjas e a carne hoje, e entre as laranjas e a carne há vinte anos, pois embora sejam produtos diferentes, apresentam a mesma base monetária, o que permite uma comparação de preços.

Um gráfico que apresenta os valores nominais dos preços no tempo apresenta além da variação da medida (o preço), uma variação no desenho (preços com valores reais diferentes). A escala vertical efetivamente muda, pois o valor do dinheiro muda com o tempo, distorcendo o gráfico. Então, o único modo de pensar claramente sobre dinheiro no tempo é fazer comparações usando unidades monetárias ajustadas pela inflação. Ajuste os valores do passado de acordo com a inflação do período, e assim você saberá que está apresentando os preços em valores reais, e não nominais.

Um exemplo que está constantemente nos noticiários é o preço do barril de petróleo. Os jornalistas estão a todo o momento anunciando, com um semblante de preocupação, a quebra de novos recordes no preço do barril de petróleo. Considerando que esse preço é cotado em dólares americanos, e há inflação nos Estados Unidos, então é de se esperar que com o passar do tempo o preço nominal seja reajustado e chegue a patamares inéditos, no entanto, sem implicar necessariamente num aumento real.

O gráfico a seguir mostra a variação do preço do barril de petróleo de Janeiro de 2000 a Janeiro de 2005. O observador perceberá uma clara tendência de aumento, e logo concluirá que deverá esperar por um aumento no preço dos combustíveis em breve.

O que pode passar despercebido é que o título do gráfico indica que estes são os valores nominais, e, portanto, sem o ajuste pela inflação. Se este gráfico tiver os valores do passado ajustados pela inflação, eles tornarão-se valores reais, o que geralmente significa valores absolutos maiores. Quanto mais no passado estiver o valor, maior a inflação acumulada no período, e maior será a diferença entre o valor nominal e o real.

O gráfico com os valores reais tenderá a ser mais plano, e a tendência de subida dos preços ficará menos evidente.

Gráfico retirado do relatório anual de uma grande estatal brasileira, mostrando a variação do preço nominal em dólares americanos por barril do petróleo entre Janeiro de 2000 e Janeiro de 2005, de acordo com três cotações. Valores de dinheiro no tempo não deflacionados causam uma variação no desenho, pois o eixo vertical muda.
Tufte [TUFTE, Edward Rolf, The Visual Display of Quantitative Information. Cheshire: Graphics Press, 2007, pág. 68] sugere o seguinte princípio para gráficos sobre dinheiro: “Em visualizações de dinheiro no tempo, unidades de medida monetárias deflacionadas e padronizadas são quase sempre melhores que unidades nominais.

Os gráficos orçamentários dos governos também devem considerar os efeitos da inflação, assim como uma segunda fonte de distorção: a variação da população. As medidas orçamentárias dos governos, como a arrecadação de impostos, as despesas com serviços públicos, ou os investimentos em determinado setor, são diretamente proporcionais à população que paga impostos, utiliza os serviços públicos ou indica um crescimento que requer novos investimentos.

Do mesmo modo que a comparação entre valores monetários em tempos diferentes requer a utilização de uma unidade padronizada de medida (como por exemplo, os preços deflacionados ou reais), a comparação de receitas e despesas do governo só fazem sentido quando reduzidas a uma unidade padronizada de medida que leve em consideração a população considerada. Em gráficos governamentais, faz muito mais sentido pensar em termos de unidades monetárias reais per capita.

Os gráficos de orçamentos e gastos governamentais geralmente dão a impressão de estarem subindo rapidamente, o que serve de material para muitas reportagens sensacionalistas e críticas ao governo. Entretanto é de se esperar que os valores de arrecadação e gastos dos governos constantemente cheguem a valores nominais inéditos, tanto pelo efeito da inflação, quanto pelo aumento da população. Este efeito só não ocorrerá em localidades com deflação, ou decréscimo populacional.

Assim, enquanto gráficos em valores nominais podem indicar um aumento de orçamento ou despesas, quando normalizados pela inflação e pelo aumento da população, podem indicar até uma queda.

Gráfico de evolução da receita do Governo do Estado de São Paulo entre 2000 e 2006, que indica um crescimento estabilizado. Note que os valores apresentados são nominais. Se as medidas deste gráfico fossem padronizadas em unidades monetárias reais per capita, poderiam indicar um nível constante ou até mesmo um decréscimo de receita. [Gráfico disponível em http://www.planejamento.sp.gov.br/PlanOrca/orca.asp]
A aplicação da aritmética faz possível levar em consideração a população e a inflação. Computar gastos em unidades monetárias reais per capita geralmente revela uma situação bem diferente e mais precisa do que os gráficos de medidas não padronizadas.

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